sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Igualdade não tem cor

 No Dia da Consciência Negra, texto aborda o racismo estrutural no país




 

(*) Ana Cristina Vallada

 

Pra começar, preciso avisar que sou branca. Isso me coloca num lugar, no mínimo, inadequado pra falar sobre racismo. Por outro lado, sinto que o engajamento na luta por igualdade não pode depender da cor da pele - precisa ser de todo mundo. A polêmica em torno da declaração de Luiza Trajano sobre um processo seletivo exclusivo pra negros se deve ao fato de que os brancos se sentem merecedores de privilégios. No fundo, acreditam que são superiores e que devem ser donos das posições de destaque. Mas, primeiro, os fatos. A rede de lojas Magazine Luiza anunciou em setembro que abriria um processo seletivo para contratação de trainees do qual só candidatos negros poderiam participar. Os selecionados receberiam salário de R$ 6 mil e benefícios. O anúncio foi seguido por uma onda de protestos, a empresa foi acusada de “racismo reverso” e a Defensoria Pública da União moveu ação contra o Magazine Luiza e pediu indenização por danos morais coletivos. O Ministério Público do Trabalho de São Paulo entendeu não haver nada ilícito no processo seletivo. Voltemos, então, aos privilégios que os brancos acham que devem ter. O nome disso é racismo. E racismo do pior tipo, aquele entranhado na cultura, nas crenças e nos hábitos das pessoas, aquele que nem sempre é verbalizado, mas que é sentido profundamente, está enraizado nas organizações sociais. Racismo estrutural porque é ele que sustenta a estrutura desigual da sociedade brasileira. De acordo com o IBGE (2019), 55% dos jovens pardos ou negros chegam ao ensino superior. Entre os brancos, são 78%. O rendimento médio de pardos e pretos é de R$ 1.608,00, enquanto os brancos ganham, em média, 73,9% a mais: R$ 2.796,00. O mesmo IBGE afirma que os negros são maioria em atividades braçais enquanto os brancos ocupam a maior parte dos cargos de chefia e que exigem mais qualificação. Quem reclama agora de um processo seletivo só pra negros provavelmente nunca se incomodou com as seleções às quais os negros não tinham acesso. Não porque fossem proibidos de participar, mas porque nunca tiveram como competir em condição de igualdade com os brancos. A iniciativa do Magazine Luiza nada mais é do que reparação da história. O Brasil contou com mão de obra negra e escrava durante 300 anos e as sequelas perduram até hoje. A situação só vai mudar quando os brancos entenderem que é preciso dar aos negros as oportunidades que lhes foram tiradas ao longo de 5 séculos.

Termino com um convite. Você já viu Olhos que Condenam, na Netflix? Dentro da minha pele, no Globoplay? Se tiver chance, assista. Só poderemos lutar juntos por um mundo igualitário, um mundo em que a cor da pele não seja fator de exclusão social, quando entendermos o que se passa na realidade do outro e nos solidarizarmos com ele.

 

(*) A autora é jornalista

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