Consultor diz que é
preciso atitudes
sérias, mas sempre é possível salvar um rio
Sudão: país enfrenta a escassez de água potável
Para o administrador de empresas
e consultor em Saneamento Ambiental José Aurélio Boranga, “o ser humano será
responsável pela falta d’água no planeta, se não forem tomadas atitudes sérias
para a utilização racional”. Boranga, que é ex-presidente e conselheiro vitalício
da ABES - Associação Brasileira de Saneamento Ambiental, concedeu entrevista
exclusiva à revista Hadar e ao blog Marconews.
Veja agora os principais trechos da entrevista
Para Boranga,
entre as iniciativas para levar água potável às pessoas, está a necessidade de
que “os governos ampliem os mecanismos para criação de uma consciência
coletiva de que a água é um produto escasso e precisa ser usado de forma
racional, evitando qualquer desperdício. É preciso intensificar a todos os
níveis da sociedade, informações que criem esta consciência. Na minha opinião
isso tem que ser feito a partir da pré-escola, atingindo toda a cadeia
educacional e a partir daí o restante da população”. O consultor destaca ainda:
“medidas que também penalizem as pessoas, que mesmo após intensas campanhas
permanentes de conscientização insistam em desperdiçar água, precisarão ser
adotadas”.
Alternativas
“Outra fonte, que é utilizada em
alguns países onde a escassez de água já é muito severa, é o processo de
dessalinização das águas dos oceanos. Já existe também tecnologia
disponível para reutilização dos esgotos em diversas atividades, como lavagem
de pátios, irrigação de jardins urbanos, nos processos industriais, etc...,
onde hoje se utiliza água potável”, afirma Boranga.
Ele é
enfático ao dizer sobre a responsabilidade da falta de água no planeta. “O ser
humano será o responsável pela falta de água no planeta, se não forem tomadas
atitudes sérias para a utilização de forma racional, conforme disse acima. Mas
também será o ser humano o responsável pelos avanços tecnológicos que
permitirão tornar o processo de dessalinização dos oceanos mais acessível, pois
hoje isso é caríssimo. Será o ser humano responsável pelo reaproveitamento das
águas de esgoto, inclusive para torná-la potável. A humanidade é dona do seu
destino, caberá a ela decidir se quer sucumbir por falta de água ou dar a volta
por cima é transformar o mundo num lugar melhor do que é hoje”.
Guerra por água
Citando fatos
históricos, Boranga lembra que a “guerra por causa da água não é novidade. Suméria
(atual Iraque/Kuwait) - 2.500 A.C - a primeira guerra que se tem conhecimento
que teria sido causada por água aconteceu às margens do Rio Eufrates, região
onde fica o atual Iraque. Acredita-se que o rei da cidade-Estado de Lagash,
tenha desviado o curso do rio e deixado outra cidade, chamada Umma, sem água, o
que teria gerado uma disputa entre as cidades pelo mineral vindo do rio. Sudão,
1963. Até os dias de hoje a falta de água foi um dos fatores que impulsionaram
o conflito que já matou milhões de pessoas na guerra civil entre Sudão e Sudão
do Sul. Os pesquisadores apontaram a água como um dos principais motivos,
estando entre motivações políticas, econômicas e sociais. Turquia - 1998 e 2003
- não foi exatamente uma guerra, mas acredita-se que em 2003 houve uma
disputa de bastidores entre forças americanas, curdos e turcos com relação à
água dos rios Tigre e Eufrates, quando os Estados Unidos invadiram o Iraque. Em
1998, a Síria e a Turquia também teriam passado por forte tensão pelo mesmo
motivo”.
Estudo
Segundo Boranga, “um estudo da
Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, mostra a relação entre a escassez
de água e guerra. Analisando o fenômeno El Niño, que em ciclos de três a sete
anos provoca aumento na temperatura e diminuição no volume de chuvas, os
pesquisadores descobriram que, nos 90 países tropicais afetados pelo fenômeno
climático entre 1950 e 2004, o risco de uma guerra civil dobrou, passando de 3%
para 6%. Algumas guerras já foram iniciadas por causa da água na história. Claro,
se a humanidade não se conscientizar que a água é um bem escasso, poderemos ter
conflitos sangrentos por conta disso”.
Brasil
José Aurélio
Boranga afirma que, no Brasil, “já existem grandes projetos de reversão de
Bacias Hidrográficas, para atender demandas de consumo. Um exemplo bastante
conhecido e recente, foi a reversão de Bacia do São Lourenço, que traz água do
Vale do Ribeira, para reforçar o abastecimento da Região Metropolitana de São
Paulo. Na verdade, toda a Região Metropolitana de São Paulo, cuja
disponibilidade de recursos hídricos/por habitante/dia é a mais baixa do país,
é abastecida por recursos hídricos, na sua grande maioria, importados de outras
bacias, através de reversão”.
Sobre a
poluição dos rios, principalmente no estado de São Paulo, o consultor afirma
que “com certeza é sempre possível salvar rios degradados. O Tietê não será
diferente. Especialmente o Rio Tietê, tem ao longo do tempo diminuído a
sua Mancha de poluição, com um grande trabalho feito pela Sabesp”. Segundo
Boranga, entre 2010 e 2018, a mancha de poluição do rio caiu de 243 km para 122
km.
“Então vejamos,
que de 2010 a 2018, mais de 120 Km do Rio Tietê, foram despoluídos. Sendo
assim, basta eliminar os pontos poluidores, repor matas ciliares, que os rios
voltam a ter vida”.
Para Boranga,
existe no país legislação que visa proteger nossas águas, mas falta
fiscalização. “A Lei 9.433 de 08 de janeiro de 1997, que ficou conhecida como
Lei das Águas, institui a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), que
estabelece instrumentos para gestão dos recursos hídricos de domínio federal
(aqueles que atravessam mais de um estado ou fazem fronteira. Como por exemplo,
o Rio Paraná) e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
(SINGREH). Os instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, são:
Planos de Recursos hídricos enquadramento dos corpos de água em classes; Outorga
dos direitos de uso de recursos hídricos; Cobrança pelo uso de recursos
hídricos; e o Sistema Nacional de informações sobre Recursos hídricos. O que
não existe é fiscalização adequada, por parte dos estados/União, com aplicações
de penalidades efetivas aos poluidores”.
Sobre o risco
do Brasil ficar sem água, Boranga diz que “a hipótese de ficar sem água para
dessedentação humana me parece extremamente remota, considerando as diversas
técnicas existentes e já citadas aqui, como dessalinização de oceanos,
etc... O que vejo com muita preocupação, caso a humanidade não se
conscientize da necessidade de tratar os recursos hídricos de forma racional, é
que estaremos sujeitos a faltar água para produção de alimentos, pois a quantidade
de água necessária para produzir comida de qualidade é extremamente alta. Ai
sim corremos um risco enorme de acontecerem conflitos gravíssimos entre nações
por conta desta escassez. Apenas como curiosidade, segundo a EMBRAPA, a média
global de água para produzir um quilo de carne bovina, é de 15,5 mil litros de água. Para se chegar a este número os pesquisadores usam cálculos matemáticos,
que levam em conta uma série de fatores. No caso da carne, este cálculo leva em
conta, quantidade de água usada na produção dos alimentos que os bois comem, da
água que eles bebem, até mesmo da água utilizada na limpeza dos currais onde
eles ficam e aí por diante. O resultado obtido nesse cálculo é dado o nome de
"Pegada Hídrica do produto". A EMBRAPA, está estudando a Pegada
Hídrica da carne no Brasil. Então é de extrema importância que seja conhecida a
Pegada Hídrica de cada produto e ter um trabalho para reduzir este valor, para
que não falte água para produção de alimentos”, finaliza Boranga.
Ação conscientizadora
No próximo dia 22
de março, o grupo Eco Maná, em parceria com a prefeitura de Itapetininga, realiza evento no auditório municipal Alcides Rossi, anexo ao Paço, para falar
da importância da preservação de rios, nascentes e recursos naturais.
O projeto Cada Gota Vale acontece a partir das nove horas e
tem como objetivo despertar uma consciência ambiental sustentável, aliada com
práticas diárias coletivas da sociedade. O evento é aberto a todos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário