quarta-feira, 19 de outubro de 2016

A arte marcada por uma vida

Aos 42 anos, o jornalista, ator e autor teatral Rogério Sardela fala de 
sua paixão pelo teatro, jornalismo e da dificuldade em viver de arte no Brasil


          Em entrevista exclusiva para o Marconews, o jornalista, ator e autor teatral Rogério Sardela (foto), conta suas experiências no jornalismo, sua paixão pelo teatro e pela música. Casado com Patrícia Sardela e pai de quatro filhos: Kátia, Bryan, Luan e Fernando (e avô de Lucas, de um ano e três meses), Rogério revela que a paixão pela escrita surgiu antes do amor pelo teatro. Com passagens por vários órgãos de imprensa, ele coleciona histórias pra lá de interessantes e pitorescas. Em sua trajetória, jornalismo, teatro e cultura caminham lado a lado.
          Veja nesta matéria algumas das passagens marcantes de uma vida pautada pela arte, mas que também deixou sua marca na arte e cultura itapetininganas.

Marconews - Conte um pouco de sua história. Como se interessou pelas artes, em especial o teatro? E como foi sua experiência no jornalismo? Por que decidiu seguir a sua profissão? Sua família, teve influência na sua decisão? Hoje você atua na área?

Rogério Sardela - Antes mesmo da descoberta do teatro, o talento para a escrita já se mostrava na adolescência. Fui uma criança que gostava de assistir novelas, então escrevia histórias em quadrinhos naqueles cadernos de brochura e espirais escolares (pequenos) e inventava minhas histórias, recheadas de personagens e mostrava aos amigos. Devia ter por volta de 15 anos. Foram inúmeras ‘novelas’ em quadrinhos. Aos 18 anos havia terminado de escrever mais uma história, cujo título era ‘Festa de Arromba’. Foi então que li num jornal que o município de Campina do Monte Alegre procurando novos talentos, para artes diversas. Entrei em contato com a Secretaria de Cultura daquele município, falando de meus textos. O retorno fora positivo e sem aviso prévio, tomei um ônibus e segui para lá, com o objetivo de conversar com o responsável. Lamentavelmente a pessoa com quem deveria falar havia viajado para Itapetininga e nos desencontramos. Tal pessoa era o saudoso ator Altair Lima, então responsável pela pasta de Cultura de Campina do Monte Alegre. Acabei deixando o original da história, sem possuir qualquer cópia, para que Lima pudesse ler e posteriormente me dar um retorno, o que nunca aconteceu, pois telefonei diversas vezes para lá e diziam que ele não estava ou que havia deixado a Prefeitura.
Ainda aos 18 anos, apresentado pelo amigo Jorge Abelardo de Barros, conheci o Grupo Teatral Ciranda da Lua, dirigido por Maurício Lima Oliveira.  O ano era 1993. Antes, minhas únicas experiências foram fazendo figuração na Paixão de Cristo, em 1990. No primeiro ano de Ciranda da Lua participei de três montagens, sendo Pequenos Trechos de Uma Grande Obra (que reunia pérolas de Shakespeare). Nesta, fiz um Romeu cômico para o clássico ‘Romeu & Julieta’, além de A Cartomante, onde declamei um poema de Álvares de Azevedo chamado ‘Se eu morresse amanhã’, o qual gosto muito e o infantil Pluft, o Fantasminha, de Maria Clara Machado, interpretando o marinheiro João.  Esta montagem de Pluft fez grande sucesso entre crianças e adultos e as apresentações ocorreram no extinto Grêmio Estudantino Cel. Fernando Prestes (atual biblioteca Municipal Dr. Júlio Prestes de Albuquerque). Em meio a tudo isso sempre fui uma pessoa que gostava de ler. Desde criança frequentava a biblioteca e lembro-me até hoje do primeiro livro que li naquele espaço: O Reizinho Mandão, de Ruth Rocha, por volta dos dez anos. Li muito as histórias do Cachorrinho Samba, Alice no País das Maravilhas e outros da coleção Vagalume.
A leitura incluía jornais como Estadão, Folha de São Paulo, Notícias Populares e jornais locais, como Nossa Terra, para o qual escrevi uma carta em 1994, sem jamais imaginar que viria dentro de pouco tempo a integrar o time de colunistas e em seguida, a própria Redação. Faço uma observação que entre 1992 a 1995, ao mesmo tempo em que participava do Ciranda da Lua, também gostava de cantar, aliás, a paixão pela música começou em 1989, quando mantinha com amigos um grupo de dublagens chamado Space Star. Com o fim do grupo, em 1992 decidi cantar utilizando karaokês e fui convidado para cantar em saraus culturais (inclusive um deles foi em 1994, dentro do recinto da Expo-Agro), além de clubes e fiz algumas apresentações na extinta SP Sul TV, nos programas da Paula Guarnieri e do Ivan Barsanti ao lado da Regina Soares. O teatro acabou tomando mais espaço em minha vida e a música acabou sendo deixada de lado, mas nunca esquecida, pois ainda tenho planos para esta arte. Na adolescência compus várias letras românticas, estilo que gosto muito.

Rogério Sardela na redação do jornal Nossa Terra, nos anos 90

Em janeiro de 1995, descobri que minha amiga de infância, Leila Rosana Assunção de Meira (a Leila Corinthiana), era colaboradora do jornal Nossa Terra. Conversamos sobre minha vontade de integrar o jornal. Então redigi algumas notas sobre os famosos da TV e apresentado ao editor Hélio Rubens de Arruda e Miranda, acabei fazendo minha estreia no NT, como carinhosamente chamávamos o jornal Nossa Terra. Lembro-me daquele sábado, como costumeiramente comprava o exemplar e fiquei surpreso ao conferir que minha coluna havia sido publicada sob o título de ‘Mundo Artístico’.  A experiência com o jornalismo foi fantástica, pois através dela pude exercitar ainda mais a escrita, reportando sobre diversos assuntos, sendo não somente redator, mas também repórter e fotógrafo. Não se usava a Internet como nos dias de hoje, bem como as máquinas fotográficas digitais, mas o bom e velho filme. O teatro e jornal caminharam juntos, mas um ano antes, em 1994, participei da encenação de O Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, interpretando o Padeiro. Em 95 ainda fiz O Sonho de Uma Noite de Verão, encerrando assim minha trajetória no Ciranda da Lua, para no mesmo ano criar o grupo teatral Corpo & Alma, que me deu a liberdade de trabalhar com meus próprios textos teatrais.
A trajetória na imprensa não parou. Depois do Nossa Terra fui convidado a integrar a equipe do Jornal Rota 21, passando ainda pelo Jornal Falando D, Jornal Correio de Itapetininga e O Dia Jornal. Permaneci um longo tempo como colunista do Jornal Cidade, da Maria Aparecida Rodrigues dos Santos, irmã do saudoso Osmar, da Gazeta de Itapetininga. Não posso deixar de mencionar que a mesma equipe de Redação do NT ainda era responsável pelas matérias do delicioso e polêmico tablóide O Popular de Itapetininga.  Neste caso, o Pop, teve uma edição que entrou para história, às vésperas das eleições de 1996, quando denunciou uma manobra vereadores da Câmara local, que aprovaram o aumento de seus próprios salários para o próximo mandato, o que despertou a ira de alguns edis, que mandaram apreender os exemplares e até mesmo funcionários foram parar na delegacia, mas verdade seja dita, o fato só fortaleceu o ‘jornal corajoso que diz o que é preciso’ (slogan usado à época pelo O Popular). Outra experiência inusitada que tive como repórter para O Popular aconteceu num velório. Um cidadão havia morrido na Santa Casa de Misericórdia local por possível negligência médica. O velório estava cheio e lá fui eu, com a câmera de filme e um bloco de anotações. Estava ao lado do caixão, louco para fazer uma foto, mas com receio e medo de ser expulso do ambiente, afinal, o clima ali era de tristeza. Foi quando um familiar do falecido se aproximou e perguntou se eu estava pretendendo fotografar. Então perguntei se ele gostaria. Com a afirmação, era tudo o que eu mais queria. Fiz o trabalho jornalístico e ainda encaminhei pelo correio um exemplar da reportagem para o irmão do falecido. Em 1995 Itapetininga ganhava a Revista Visual, do colunista e fotógrafo Zézinho Trindade. Também tive a honra de escrever para várias edições. Conheci Zezinho em 1994, como seu convidado para o Sarau Cultural da Expo-Agro. Outra matéria envolvendo velório, desta vez em 1998, já no Jornal Rota 21. Alguém havia colocado um bilhete embaixo da porta da Redação avisando que um homem havia morrido ‘às minguas’ em plena via pública e que era para a reportagem comparecer ao velório. Lá fui eu para mais uma missão. Estranhei pelo fato de que não havia ninguém velando o corpo, já que todos os familiares estavam do lado de fora daquela sala. Fui para o lado do caixão e então entendi a razão de ninguém estar ali. O corpo estava exalando mau cheiro.
Voltando ao teatro, com o objetivo de fazer algo diferente, escrevi um monólogo chamado Revelações de Um Cinquentão. Foi uma experiência ótima, pois segurar a atenção do público, sozinho, por 50 minutos, não é fácil. Encenei esta peça em 2010 e atualmente retomo o texto, para apresentá-la em breve, com algumas alterações. Já na era da Internet, no ano 2000 comecei a escrever para o site ROL – Região On-Line, do editor Hélio Rubens de Arruda e Miranda. Em 2013 fui redator de O Dia Jornal, tendo este ano de 2016 participado da Revista Top da Cidade com a série de entrevistas Por Onde Anda?
Tanto no teatro quando no jornalismo tudo aconteceu por iniciativa própria. A família não me influenciou, mas sempre torcem por tudo que faço.  Sim, continuo nas duas áreas, mas como disse em outro trecho, tenho projetos para a música e acabei de disputar pela primeira vez as eleições para vereador. (Nota da redação: Rogério Sardela teve 147 votos; ele é filiado ao PTN).

Marconews - Como é viver de arte em uma cidade como Itapetininga? Na sua opinião, o que precisa melhor na cidade nesta área?

Rogério Sardela - Quando se está começando, ‘viver da arte’ é muito gostoso, mas com o passar do tempo percebe-se que o artista não vive só de aplausos. Até a estreia muita coisa acontece. O sucesso de um espetáculo não se faz apenas de plateia e vai muito além do texto, da direção, da escolha dos atores e claro, de apoio (patrocinadores), coisa que em Itapetininga sempre foi muito difícil. Comigo não foi diferente. Foi amor à arte mesmo, mas passados 23 anos, lamentavelmente estamos na mesma situação no sentido de apoio, ainda mais neste momento de crise financeira que o País atravessa. Penso que Itapetininga ainda não possui seu tão sonhado Teatro Municipal. Tem sim, espaços improvisados, mas um teatro não. Temos o do Sesi, espetacular, mas é privado. O saudoso diretor e ator Antonio Balint dizia que queria que Itapetininga fosse conhecida como a Terra do Teatro, assim como Tatuí é a Terra da Música. Esta é uma bandeira que defenderei. Outra resistência que sempre existiu é a do próprio público, não acostumado a prestigiar teatro, mas aos poucos a nova geração de adolescentes está mais aberta para esta arte.

Marconews – Você está preparando uma edição especial da Semanart, evento promovido pelo Jornal Nossa Terra nos anos 90. Qual o objetivo deste evento agora?
Rogério Sardela - Em janeiro de 1997 o Jornal Nossa Terra promoveu a Semanart – Semana de Artes no Clube Venâncio Ayres. O evento reuniu colaboradores que apresentaram suas experiências com passarela, teatro, exposição de obras de artes, músicas e palestras.  Como sugestão do editor Hélio Rubens, estou preparando uma nova edição, cujo objetivo é o reencontro de funcionários, colunistas, amigos e leitores do Jornal Nossa Terra, com apresentações culturais.

Marconews – Você é muito ligado à cantora Katia. Como você avalia o mercado de arte, principalmente música, atualmene? Há perspectiva de crescimento?
Rogério Sardela - Minha amizade com a Kátia é bastante antiga. Eu tinha apenas 13 anos quando a música ‘Qualquer Jeito’ estourava nas rádios e estava em primeiro lugar no programa Globo de Ouro. Quem tem mais de 35 anos lembra de Kátia, a cantora lançada por Roberto Carlos. Sonhava em conhecê-la. Isto foi possível quando iniciei meu trabalho no Nossa Terra, através de uma entrevista via fax e desde então não perdemos o contato. Cheguei a batizar minha primeira filha com seu nome, em homenagem à cantora, que pessoalmente conheci no ano 2000, quando eu trabalhava como assessor de imprensa no Sindicato dos Comerciários. Kátia, para quem não sabe, trabalha com informática para deficientes visuais e ajudou no desenvolvimento e divulgação do software Dosvox, então veio fazer o lançamento do programa em Itapetininga, no referido sindicato. É uma pessoa muito querida e amada pelo público, com quem falo praticamente todos os dias. Kátia está gravando novo CD e estou agenciando diretamente seus shows. Com certeza fará apresentação na cidade.
O mercado de artes sempre sobreviveu, com crise ou não. Há espaço para todos. É fato que hoje a crise atinge a todos, independentemente se é famoso ou não. Ainda sobre teatro, ao mesmo tempo em que ensaio Revelações de Um Cinquentão, escrevo uma nova comédia, que terá quatro personagens masculinos. Amo escrever comédia, mas adoraria enveredar para um drama quem sabe...Atualmente também sou membro da diretoria do CRI – Clube Recreativo Itapetiningano, para o qual escrevo o livro sobre seus 100 anos.

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